#21 Importância do Diagnóstico
Com o lançamento do novo manual (DSM-5-TR) há um debate na mesa. Por quê diagnósticos são importantes e qual a limitação? Por quê devemos invalidar o anterior e quais são as mudanças da nova edição?
PORQUE DIAGNOSTICAR?
A psicologia, de modo geral, possui olhares antagônicos a esta questão.
Que o diagnóstico não tem valor, já que cada indivíduo é uma realidade única e incomparável.
ou
Que o diagnóstico em saúde mental tem o mesmo lugar e valor que em qualquer outra área da saúde, como qualquer outro diagnóstico.
Atualmente, a ciência e as abordagens psicológicas cognitivas e comportamentais trabalham com a segunda opção. O diagnóstico tem a mesma importância na saúde mental, quanto na saúde fisiológica. Afinal, a visão que somos separados em mente e corpo já foi ultrapassada.
O QUE É UM DIAGNÓSTICO?
O diagnostico é uma sistematização, uma classificação de indivíduos por algum tipo de semelhança. Isso é feito para que, didaticamente, seja mais fácil de serem estudados quando há semelhanças entre comportamentos, sensações, pensamentos, etc. Quando falamos de delineamento de estudos de tratamentos e prognósticos, é extremamente importante.
Mas o que classificar? Dentre os aspectos e fenômenos humanos podemos dividir em:
Semelhantes » comuns a TODOS os seres humanos, como sono, fome, sede.
Singulares » embora importantes para compreensão do indivíduo, aqui estão as características únicas do mesmo e não são foco de diagnóstico.
Em parte semelhantes, em parte diferentes » encontrados em ALGUMAS pessoas. Aqui está o grande interesse da psicopatologia – onde são analisados os sinais e sintomas.
ENTÃO, QUAL SERIA A IMPORTÂNCIA DO DIAGNÓSTICO?
» Aprofundar o conhecimento sobre o indivíduo, sua cognição, comportamento e emoções;
» Permitir o avanço da ciência, pois conforme mais se conhece sobre determinado fenômeno, mais aprofundado é o estudo de sua origem, identificação e tratamento.
» Antever o prognóstico - a evolução do quadro.
» Estabelecer ações terapêuticas, o tratamento – com a finalidade de aplacar o sofrimento (SEMPRE!).
» Facilitar a comunicação entre profissionais, pesquisadores e paciente. A padronização da linguagem facilita o trabalho interdisciplinar. Se não fosse assim, cada profissional daria uma nomenclatura distinta, com uma forma distinta de tratamento e condução do caso.
PSICÓLOGO PODE (E DEVE) SABER DIAGNOSTICAR
Você pode escolher não trabalhar com tratamento de transtornos mentais em sua prática profissional, mas saiba que há essa opção. Como a disciplina de psicopatologia é dada de forma muito superficial nas graduações de psicologia, há ainda muita insegurança e medo entre os profissionais. Essa resistência ao diagnóstico de algumas abordagens da Psicologia tem origem no movimento anti-psiquiátrico, que começou nas décadas de 60/70. O movimento foi super válido e surgiu contra a psiquiatria que até então tinha métodos muito questionáveis, confirmando estereótipos e utilização de instrumentos de controle moral.
Mas e o que diz o Conselho Federal de Psicologia?
“A respeito da utilização da CID-10 em laudos psicológicos, verifica-se que, conforme a parágrafo único do art. 1º da Resolução CFP nº 15/1996, que institui e regulamenta a concessão de atestado Psicológico para tratamento de saúde por problemas psicológicos, “fica facultado ao psicólogo o uso do Código Internacional de Doenças - CID, ou outros Códigos de diagnóstico, científica e socialmente reconhecidos, como fonte para enquadramento de diagnóstico.” Uma vez que a CID-10 é uma Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde é publicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), é um manual de uso internacional e não pode ser entendida como propriedade dos médicos. Ademais, ela foi elaborada a partir da contribuição de várias áreas do conhecimento, não só da medicina.”
PARTICULARIDADES DOS MANUAIS DE CLASSIFICAÇÃO NA SAÚDE MENTAL
Na medicina geral, toda doença parte de uma origem, uma parte inicial e fundamental que é seguida de uma sequência de cadeias de eventos que desencadeia o processo final, que é a manifestação da doença. Para muitas das doenças fisiológicas, atualmente, a medicina conseguiu detectar a mudança inicial (como uma mutação gênica) e identificar também toda a cadeia de eventos. Por isso que o CID (Classificação Internacional de Doenças) sistematiza as doenças (não psiquiátricas) pelas suas alterações centrais como: doenças infecciosas, doenças neoplásicas, doenças por alterações isquêmicas, etc.
Porém, para as doenças psiquiátricas, ainda há um longo caminho pela frente. Sabemos que os transtornos mentais são multifatoriais, mas não conseguimos (ainda) identificar a alteração central que dá origem a série de alterações em cadeia que resultam na manifestação do transtorno. Então, a forma de classificação existente atualmente é classificá-los pela apresentação final (sinais e sintomas) da doença e não pelo processo originário.
Se a medicina geral fosse classificar da mesma forma as doenças, o CID teria capítulos separados pelos sintomas (doenças que causam tosse, doenças que causam febre, doenças que coçam, etc) - o que não faria o menor sentido.
Na psiquiatria, as classificações são realizadas não por um componente de alteração biológica e sim através de um grupo de pesquisadores que entram em consenso sobre o agrupamento de determinados sintomas, os prognósticos e fatores de risco para a existência de um diagnóstico. O DSM ou o CID (F) é o resumo do resumo.
Diagnóstico não é sinônimo de manual de classificação.
Aliás, um diagnóstico não pode se limitar ao resumo de sinais e sintomas que constam nos manuais de classificação, precisamos saber dos elementos definidores de cada transtorno, quais as alterações psicopatológicas que estão presentes nos indivíduos que entram nessa classificação, quais as formas de apresentação, quais as evoluções possíveis, quais os outros transtornos que parece com esse e como diferenciá-los e quais as características morfológicas que já se conhece desse transtornos.
E mais importante, como você consegue identificar os elementos que estão descritos como um sinal ou sintoma no manual de classificação?
No capítulo de TOC, um dos critérios são os pensamentos obsessivos mas o paciente não chegará com esta informação pronta para você. Então, como você identifica o que é um pensamento obsessivo? Como diferenciar de um pensamento intrusivo? E se for uma alucinação auditiva?
Como se extrai esses elementos?
O paciente não vai chegar com um check list dos sinais e sintomas como está descrito nos manuais. Por isso, a importância de estudar a psicopatologia geral - reconhecer e diferenciar os sinais e sintomas - saber traduzir o relato e o comportamento da pessoal real para o que está na listagem dos manuais.
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BREVE HISTÓRIA DO DSM
O Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5.ª edição revisada ou DSM-5-TR foi produzido pela Associação Americana de Psiquiatria e atualmente é o livro referência em transtornos mentais. Tem como objetivo ser guia de consulta para psicólogos, psiquiatras, terapeutas ocupacionais, enfermeiros e demais profissionais da saúde.
Está em sua 5ª Edição revisada que foi publicada em novembro de 2021 (nos EUA), no Brasil a publicação ocorreu no mês de Janeiro de 2023 e está substituindo o DSM-5 criado em 2013. Desde o DSM-I, criado em 1952, esse manual tem sido uma das bases de diagnósticos de saúde mental mais usados no mundo. Para que cada edição seja lançada, há de existir um substancial suporte de novos estudos científicos, há de se ter muito avanço nos estudos sobre transtornos mentais e muitas alterações que justifiquem sua nova edição.
O QUE É CADA MODELO?
» MODELO HIERÁRQUICO »
Baseados no modelo psicodinâmico, da Psicanálise: Neurose e Psicose. No topo, distúrbios orgânicos, seguidos pelas Neuroses graves e na base, Neurose e Perversão. Na década de 70, começaram os movimentos Anti-psiquiatria e questionamentos da ala médica em geral para que a Psiquiatria se posicionasse: afinal, era a Psiquiatria uma filosofia ou medicina (ciência)?
» MODELO CATEGÓRICO »
Em 1980, a APA lançou o DSM-III, juntamente com o CID 9, revolucionando o modelo diagnóstico de saúde mental e estabelecendo o modelo categórico (sim ou não). Este tipo de modelo apresentava critérios mínimos a serem preenchidos para ser considerado um transtorno, além de critérios excludentes. Os critérios excludentes estavam presentes nas descrições de alguns diagnósticos e eram determinantes para o diagnóstico ser fechado, se não o preenchesse, não se enquadrava. O modelo categórico tinha maior vantagem quanto ao hierárquico porque era mais descritivo quanto aos sintomas e para termos de pesquisa era mais fácil. Porém, como desvantagem: qualquer sintoma relatado a mais, e não enquadrado na descrição do transtorno era encarado como uma comorbidade, ou seja, um quadro patológico a mais.
» MODELO DIMENSIONAL »
É o modelo vigente. Parte do pressuposto que o transtorno tem diversos espectros – leve, moderado e grave.
Exemplo: Autismo – até o DSM IV existiam o diagnóstico de Autismo, Síndrome de Asperger e diversos subdiagnósticos. Atualmente, todos são TEA – Transtorno do Espectro Autista – que possui diversas graduações (leve, moderado e grave). No modelo categórico, isso não seria possível.
Para analisar os pontos fortes e fracos desses modelos, vamos voltar a dois pontos que estudamos em Estatística:
Sensibilidade » um teste, questionário, inventário que é mais sensível e pode incluir casos que não são, pode incluir nos diagnósticos pessoas que só teriam traços e não o transtorno em si.
Especificidade » um teste, questionário, inventário que só vai incluir realmente pessoas que tem o problema, não incluirá traços.
O modelo atual (dimensional) diminui a chance de ser muito específico, de só incluir casos mais graves do transtorno, ou de quem está preenchendo TODOS os critérios. Contribuiu na redução de comorbidades infinitas, quando o paciente apresentava um sintoma não descrito em um transtorno específico, acabava sendo rotulado em mais um transtorno. Desde o DSM-5, muitas das diversas comorbidades antes apontadas, são agora chamadas de especificadores:
Exemplo: Depressão com especificador de ansiedade ou Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) com especificador deprimido
Por outro lado, a sensibilidade para este modelo de diagnóstico é maior, os critérios estão mais flexíveis.
O DSM-5 aproxima de vez a psiquiatria das ciências biológicas – como a Medicina em geral. Antes, a Psiquiatria era mentalizada, descerebralizada, ou seja, falava-se em mente separado do cérebro (visão filosófica dualista). O cérebro era uma caixa preta, não havia conhecimento do seu funcionamento. Com os avanços da Neurociência e da genética, passamos a ter, cada vez mais conhecido biológico dos transtornos mentais.
ESTRUTURA DO DSM-5 e DSM-5-TR
Explicação do modelo dimensional, detalhando o que são os espectros.
Classificação Diagnóstica dos Transtornos: organizados conforme sua maior incidência no ciclo vital. Começando pelos Transtornos do Neurodesenvolvimento até os Transtornos Neurocognitivos.
Glossário, Escalas de medida e introdução do conceito BIG 5 para Transtornos de Personalidade, apresentam como modelo alternativo. Atualmente a teoria de personalidade mais aceita é essa (Big 5), mas ainda faltam estudos. Havia uma expectativa que o DSM-5-TR trouxesse como modelo definitivo, mas os estudos não avançaram o suficiente.
CRÍTICAS AO MODELO ATUAL
Necessidade do profissional conhecer mais das funções psíquicas e suas disfuncionalidades e também saber mais profundamente cada transtorno. Há o risco de patologizar demasiadamente. O clínico menos aprofundado, poderá rotular o que não deveria, se equivocar. O modelo categórico era rígido demais, em contrapartida, o dimensional está amplo demais. Pode provocar maior discordância de diagnósticos, torna-se mais subjetivo.
DIVISÃO
Explicação do modelo dimensional, detalhando o que são os espectros.
Classificação Diagnóstica dos Transtornos. A APA procurou organizar os transtornos conforme sua maior incidência no ciclo vital. Começando pelos Transtornos do Neurodesenvolvimento até os Transtornos Neurocognitivos.
Glossário, Escalas de medida e explicação do conceito BIG 5 para transtornos de personalidade, como modelo alternativo. Atualmente a teoria de personalidade mais aceita é essa (Big 5), mas ainda faltam estudos. Introduziram o conceito no DSM-5 e mantiveram da mesma forma no DSM-5-TR.
MUDANÇAS DO DSM-5-TR
A revisão de texto do DSM-5 (DSM-5-TR) é a primeira revisão publicada do DSM-5 desde sua publicação original em 2013. A revisão é resultado de um processo de três anos envolvendo mais de 200 especialistas, a maioria dos quais participaram do desenvolvimento do DSM-5. Havia 20 Grupos de Revisão para cobrir os capítulos da Seção II. Isso foi complementado por revisões de literatura que cobriam o período dos 10 anos anteriores e que também passaram por uma revisão forense.
ATUALIZAÇÃO DA TERMINOLOGIA
A terminologia foi atualizada para se adequar ao uso atual preferido. A priori, não é bom que se mude as nomenclaturas e quando realizadas, devem ser muito bem fundamentadas.
Medicamentos neurolépticos »»» medicamentos antipsicóticos ou outros agentes bloqueadores de receptores de dopamina: Toda menção a medicamentos neurolépticos foi atualizada ao longo do DSM. O termo Neuroléptico diz respeito ao que causa sintomas neurológicos. Mas o remédio em si não é para causar sintomas neurológicos e sim para tirar sintomas psicóticos e que tem como um dos possíveis efeitos colaterais os sintomas neurológicos. Não faz sentido o medicamento levar o nome de um dos seus possíveis efeitos colaterais sim para o que ele está sendo ministrado/indicado. Efeito colateral – síndrome neuroléptica maligna.
Disforia de gênero: A terminologia nos especificadores de disforia de gênero foi atualizada para usar linguagem culturalmente sensível.
Gênero desejado »»» Gênero experimentado: O termo anterior referência a um desejo, como uma vontade. O que está incorreto dada a vivência dos sujeitos. O correto é gênero experenciado.
Procedimento médico transexual »»» Procedimento médico de afirmação de gênero: O termo anterior remetia a uma mudança de gênero realizada através de procedimento cirurgico. Quando na realidade, o procedimento é realizado para que ele/ela esteja no gênero a qual pertence psiquicamente. Por isso que a nomenclatura foi modificada para afirmação de gênero.
Tratamento hormonal transexual »»» Tratamento hormonal de afirmação de gênero: mesma justificativa acima.
Homem de nascimento/ Mulher de nascimento »»» Indivíduo designado homem/mulher no nascimento: A afirmação de que o indivíduo nasceu de um jeito e o modificou está distante da experiência de quem vivencia a disforia de gênero. Eles relatam que SEMPRE pertenceram ao gênero que afirmam.
Transtorno de conversão »»» Transtorno de sintomas Neurológicos funcionais: Há uma tendencia de trazer nomes de transtornos de que sejam mais descritivos da manifestação que ocorre. Transtorno de conversão não diz muito sobre a apresentação do transtorno. Conversão é referente ao déficit neurológico com base funcional, mas não é um termo de conhecimento geral. O nome atual traz mais luz ao transtorno em si.
Deficiência intelectual »»» Transtorno do desenvolvimento intelectual: Esse transtorno tem tido sua nomenclatura alterada ao longo do tempo (este é o 3º termo). Começou como retardo mental, que era muito estigmatizado. No DSM-V mudou para deficiência intelectual. O que essas duas nomenclaturas remetiam a um transtorno estático, porém, este é um transtorno do desenvolvimento. A mudança dessa vez foi para dar uma perspectiva Desenvolvimental do transtorno e também de maleabilidade. Uma dificuldade, deficiência, identificada aos 5 anos não necessariamente permanecerá aos 15 anos.
Quando falamos de deficiência auditiva / visual – estamos falando de uma deficiência em órgãos que já se desenvolveram. O que não é o caso do desenvolvimento cerebral – os fatores ambientais vão afetar este desenvolvimento em alguma medida.
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Cultura, Racismo e Discriminação: A mudança girou em torno da linguagem e da substituição de termos.
Termo "racializado" é usado em vez de "raça/racial": para destacar a natureza socialmente construída da raça;
Termos "minoria" e "não-branca" são evitados porque descrevem grupos sociais em relação a uma "maioria" racializada, prática que tende a perpetuar hierarquias sociais;
Termo emergente "Latinx" é usado no lugar de Latino/Latina para promover terminologia inclusiva de gênero.
Termo caucasiano foi retirado.
CORRESPONDÊNCIA DOS CÓDIGOS DO DSM E CID-10
A partir desse DSM, há correspondência dos códigos ao CID-10 – esta medida foi feita para ter uma facilitação.
NOVO DIAGNÓSTICO: TRANSTORNO DO LUTO PROLONGADO
O DSM-5 já havia incluído uma categoria de Transtorno de Luto Complexo Persistente como uma "condição para um estudo mais aprofundado" na seção 3 do manual. No DSM-5-TR, esse transtorno foi adicionado à seção 2 do DSM-5-TR, no capítulo de Transtornos Relacionados a Traumas e Estressores, pois estima-se que após a perda não violenta de um ente querido, 1 em cada 10 adultos enlutados corre o risco de desenvolver Transtorno de Luto Prolongado.
O indivíduo precisa ter vivido um evento – perda de alguém próximo. A partir desse evento, desenvolve uma resposta disfuncional – diferente da maior parte das pessoas que seu meio, sua comunidade vivencia. Experimenta saudades da pessoa falecida e também preocupação, pensamentos e memórias envolvidas com a pessoa falecida.
O luto não seria uma reação normal?
No DSM-4 não tinha menção alguma ao luto porque era encarado como um processo normal da vida humana. Já no DSM-5 havia a percepção de que ou o luto era normal ou era um episódio depressivo. E havia uma tendência de não medicalizar o luto. Mas quando o quadro estava bem disfuncional, era encarado como um episódio depressivo.
Estudos mais recentes passaram a apontar para uma diferença na manifestação entre as pessoas desses dois grupos (transtorno do luto prolongado e transtorno depressivo). Apontaram que o luto/a morte de alguém querido era o fator desencadeante e que os sintomas centrais não eram exatamente os elementos centrais da depressão, mas encontravam-se disfuncionais e em grande sofrimento.
Isso favoreceu a separação e a criação de uma nova entidade nosológica. Pessoas do transtorno do luto prolongado não apresentavam, não preenchiam, todos os critérios para o transtorno depressivo maior e também, todos os sintomas que apresentavam dos sintomas depressivos eram restritos ao luto. Quando passaram a examinar, perceberam que esses indivíduos se pareciam mais com indivíduos que vivenciaram algum trauma do que pessoas que estavam vivenciando a depressão.
Importante ressaltar: pessoas que tinham dificuldade em lidar, elaborar, superar o luto já procuravam a clínica, e continuarão procurando. E os profissionais já lidavam com essas pessoas. Mas, ter acesso a estas pesquisas e saber da proximidade da sintomatologia desse quadro com pessoas com TEPT, mais do que pessoas com depressão, pode auxiliar sim na prática clínica. Profissionais podem rever suas condutas e utilizar ferramentas mais adequadas ao quadro dessas pessoas.
Entender a lógica por trás do diagnóstico é FUNDAMENTAL. Porque esse diagnóstico “surgiu” agora? O que esses indivíduos tem de diferente dos demais? Isso que dará subsídio a prática clínica.
MUDANÇA NOS CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS
Esta edição apresenta modificações em mais de 70 transtornos, sendo a maioria pequenas alterações. Porém, algumas são mais significativas e abordam problemas identificados que podem levar a erros de diagnóstico:
Transtorno Alimentar restritivo evitativo (TARE):
O sintoma A foi modificado (e a parte riscada suprimida): A - Uma perturbação alimentar manifestada por
fracasso persistente em satisfazer as necessidades nutricionais e/ou energéticas apropriadas associada aum (ou mais) dos seguintes aspectos (…).Por mais que, anteriormente, na prática clínica, o profissional trataria essa criança de qualquer forma, mesmo que ela não preenchesse esse critério específico e não esperasse que ela estivesse subnutrida para conduzir o tratamento psicológico, a respeito de políticas públicas e critérios de pesquisa esta mudança fará muita diferença. Esse critério deixava o quadro subnotificado, o que, na prática, diminuía a relevância do diagnóstico e consequentemente o fomento de pesquisas e as verbas destinadas a este tipo de tratamento na saúde pública. Uma criança que só coma arroz, salsicha e tome nescau talvez não apresente exames alterados, mas não podemos dizer que ela NÃO tem uma alimentação restritiva. TEM SIM. Do jeito que estava escrito antes, dava a entender que o elemento central do diagnóstico era ter suas necessidades nutricionais ou energéticas apropriadas. Ou seja, o tratamento do TARE seria suplementação? O que estava incorreto. O elemento central do TARE é a disfuncionalidade do comportamento alimentar.
Transtorno do Espectro Autista (TEA):
O Transtorno do Espectro Autista é definido por dificuldades persistentes no uso social da comunicação verbal e não verbal (critério A), juntamente com padrões repetitivos restritos de comportamento (critério B). Enquanto o limite mínimo para o componente de comportamento repetitivo e restrito era direto (pelo menos dois de quatro), o número mínimo exigido de tipos de déficits na comunicação social e na interação era ambíguo. Especificamente, por conta da frase "conforme manifestado pelo que segue" no critério A que pode ser interpretada como "qualquer um dos seguintes" (um de três) ou " todos os seguintes" (três de três). Então, para melhorar a intenção e a clareza do texto, foi feita a mudança da frase "
conforme manifestado pelo que segue" por "conforme manifestado por todos os itens a seguir" do critério A.No caminho inverso do TARE, onde a modificação buscou abranger um maior número de notificações, o TEA tinha em sua descrição de critérios uma palavra que abrangia muitos quadros e a modificação foi realizada com o intuito de diminuir a abrangência. O número de diagnósticos “Falsos positivos” estava muito alto. A modificação atual torna um diagnóstico mais específico. Antes o critério era um dos três – um OU outro. A acurácia do diagnostico aumentou.
Transtorno do Humor não especificado:
Apresentações nas quais existem sintomas característicos de um transtorno de humor que causam sofrimento significativo e prejuízos sociais, ocupacionais ou em outras áreas do funcionamento, mas, no momento da avaliação, não possui critérios suficientes para um diagnóstico específico.
Essa categoria existia no DSM-4-TR, saiu do DSM-5 com a justificativa de que poderia existir um diagnostico incorreto por preguiça de acurácia dos profissionais. Ao invés de enquadrá-los nos demais transtornos de humor, colocavam no humor não especificado. Porém, o que foi notado nos últimos anos que aquela justificativa estava incorreta e que após a retirada deste diagnóstico, aumentou o número de diagnosticos incorretos. Então, decidiu-se voltar.
Esse transtorno está localizado nos capítulos de transtornos depressivos e transtornos bipolares e é utilizado em situações em que o clínico opta por não especificar o motivo pelo qual os critérios não são atendidos para um transtorno depressivo específico e inclui apresentações para as quais não há informações suficientes para fazer um diagnóstico mais específico (por exemplo, em ambientes de emergência).
RECOMENDAÇÕES
» Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-5-TR
» Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais - Especialmente a primeira parte (psicopatologia geral - sinais e sintomas)